Tenho que ir ao banco resolver algumas questões financeiras. Posso usar a internet, mas mesmo tendo um anti-vírus que dizem ser bem eficaz, meu computador está com vírus. Tenho que andar, pensar, observar e chegar a algumas conclusões. Conclusões são como drogas, nos trazem paz por algum tempo. Saio de casa, olho para os dois lados para atravessar a rua. Um coração de motor passa a uns 70 km/h numa rua onde crianças brincam com cachorros e mulheres conversam sobre o cotidiano.
Esse produto contém mais de 4.700 substâncias tóxicas e nicotina que causa dependência física ou psíquica. Não existem níveis seguros para consumo destas substâncias.
Lá se vai voluntariamente mais 9 mg de monóxido de carbono para dentro do meu pulmão, além daquela quantidade que respiro diariamente como pagamento de um progresso que financio para poder me deslocar confortavelmente dentro de meu Corsa Sedan ano 2003.
Há algum tempo tem sido discutida a questão da crise do petróleo. Como alternativa alguns países adotaram o biocombustível. Para atender à demanda de combustível necessária, muitos hectares de terra são usados na produção de produtos como o milho, a cana de açúcar – entre outros – em terras onde poderiam ser plantadas alimentos. Agora temos a crise dos alimentos. Neste momento estão reunidos os representantes dos oito países mais poderosos do mundo para discutir essa questão.
Agora estou na avenida; são mais uns 20 minutos de caminhada até o banco. Mais 9 mg de monóxido de carbono. A nicotina me causa um pouco de prazer. Fico levemente tonto e mais atento para atravessar a rua. Vou caminhando ao som de martelos quebrando paredes, carros, ônibus e motos. Desvio de uma escada que ocupa a calçada inteira, mas antes tenho que esperar a lotação passar pelo canto da rua, grudada na guia, onde estão paradas vidas que correm contra o tempo. A banca de jornal também obstrui o caminho. Nos jornais pendurados, a notícia de João Roberto, de 3 anos, que foi atingido por uma bala no Rio de Janeiro. A bala era da polícia que perseguia um Fiat Stilo na Tijuca. O Palio Weekend onde o menino estava com a mãe e o irmão levou 15 tiros.
Um, dois, três, quatro, cinco, seis, sete, oito, nove, dez, onze, doze, treze, quatorze, quinze tiros.
Mas a polícia estava perseguindo outro carro da Fiat, o Stilo.
João Beltrame, secretário da Segurança Pública do Rio disse que a ação policial foi desastrosa. Faltou treinamento, faltou raciocínio. Faltaram critério e preparo. Isso mesmo! Veja lá, está na capa do Diário de S. Paulo desta Terça-Feira, 8 de Julho de 2008.
De um lado o Estado, protegido por suas leis e sua segurança privada, a Polícia. De outro todos aqueles que vivem da ilegalidade. De que lado você está? Nenhum! Você está no meio, como eu. Você está no meio, a mercê de balas perdidas, de lotações assassinas e daquela pedra que pode cair na sua cabeça, só porque você achou que era mais seguro andar na calçada.
Você está no meio, ao som da sinfonia da destruição.
escrito em 8 de julho de 2008.